Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Notícias de Marte

Uma viagem pelo universo dos livros e seus autores: literatura, poesia, ensaio, cinema, banda desenhada, arte e teatro.

Notícias de Marte

Uma viagem pelo universo dos livros e seus autores: literatura, poesia, ensaio, cinema, banda desenhada, arte e teatro.

Henri Charrière - "Papillon"

Rui Luís Lima, 18.11.25

papillon.jpg

Henri Charrière
"Papillon"
Páginas: 570
Livraria Bertrand

Embora seja uma imagem tirada da net, podia perfeitamente ser o meu livro Papillon que de tão lido se está a desfazer, coitado! De tal forma que o meu Cavaleiro Andante já me ofereceu um novinho em folha. É aquele livro que nunca decepciona e ao qual volto uma e outra vez, com prazer.

Paula Nunes Lima

hernri Charriere.jpg

Henri Charrière - (1906 - 1973)

«Henri Charrière não pretendeu escrever um livro histórico, mas apenas contar, tal como ele viveu ao vivo, com dureza e fé, a extraordinária epopeia de um homem que se recusa a aceitar o que pode haver de desmedido entre a compreensível defesa de uma sociedade contra os malfeitores e uma repressão por assim dizer indigna de uma nação civilizada».

Jean-Pierre Castelnau.

Darwin Porter - "Brando Mas Pouco" / "Brando unziped"

Rui Luís Lima, 17.11.25

darwin potter.jpg

Darwin Porter
"Brando Mas Pouco" / "Brando unziped"
Páginas: 768
Pedra da Lua

Esse género literário que é a biografia teve sempre, ao longo dos anos, os seus defensores e os seus detractores, e depois há sempre as biografias apadrinhadas ou autorizadas pelos próprios biografados, como também existem as biografias não autorizadas e por vezes proibidas após uma vitória em tribunal contra o autor do livro, que por vezes até se trata de um “Ghost Writer”, assim como esse outro subgénero intitulado biografias romanceadas, como fez com sucesso a escritora norte-americana Joyce Carol Oates, quando escreveu “Blondie”, sobre Marilyn Monroe e onde Marlon Brando surge sob o nome de Anjo Negro.

marlon brando.jpg

Darwin Porter escreve “Brando mas Pouco” sobre esse actor incontornável chamado Marlon Brando. Esta biografia pretende não só retratar a vida do conhecido actor do método, um dos eleitos de Elia Kazan, como muitos estão recordados, mas também oferecer ao leitor um retrato da Hollywood dos tempos áureos de Marlon Brando, essa mesma Hollywood que Darwin Porter afirma ter conhecido muito bem.

Como não podia deixar de ser fomos obrigados a comparar esta biografia da autoria de Darwin Porter com aquela que foi escrita pelo próprio Marlon Brando e o jornalista Robert Lindsey intitulada “Canções que a Minha Mãe me Ensinou” e à medida que liamos “Brando mas Pouco” a leitura do livro revelava-se não surpreendente mas sim bastante penosa e convém salientar que este livro só viu a luz do dia após a morte do actor.

darwin porter.jpg

Em “Brando mas Pouco”, Darwin Porter pretende não só escrever sobre o actor mas também sobre o lado menos visível de Hollywood, esse lado nocturno muito pouco luminoso por onde nasciam as célebres festas privadas, onde os eleitos eram escolhidos a dedo. Pretendendo ser um conhecedor desse universo, o autor do livro confessa ter conversado com pessoas que conviveram directamente com Marlon Brando, desde colegas de profissão, até aos cineastas que o dirigiram, passando pelo círculo de amigos mas próximo.

city of netes.jpg

Mas se compararmos “Brando mas Pouco” com o fabuloso livro de Otto Friedrich, “City of Nets” / "A Cidade das Redes", percebemos que este último retrata Hollywood de uma forma incisiva, bem documentada, com humor e tristeza, e até sangue, suor e lágrimas, ao contrário do registo optado por Darwin Porter, que falha redondamente ao optar por um tom por vezes escabroso, vulgarizando o calão como linguagem, elegendo como cruzada a divulgação das tendências sexuais do “Planeta Hollywood” desses anos de ouro, referindo nomes que muitas vezes deixam incrédulo o mais comum dos leitores.

elleanor coppola.jpg

Ao longo da leitura de “Brando mas Pouco”, Darwin Porter nunca fala do melhor amigo de Marlon Brando, o actor Jack Nicholson, o que deixa logo o leitor mais atento destas “coisas de Hollywood” bastante reticente, para além de apenas dedicar 15 linhas do livro para nos falar do trabalho do actor na película “Apocalipse Now” de Francis Ford Coppola (convém dizer que Eleonor Coppola, a esposa do cineasta, dedica mais linhas a Marlon Brando no seu livro “Notes on the Making of Apocalipse Now”), mas Porter depois informa-nos que possui material sobre Marlon Brando que dava para escrever mais dez livros.

marlon brando livro.jpg

Qualquer cinéfilo atento às vidas da capital do cinema sabe que por ali não moram propriamente “anjos” e que a vida familiar de Marlon Brando foi bastante conturbada e a sua carreira repleta de sobressaltos, mas ler este livro da autoria de Darwin Porter revelou-se uma leitura bastante penosa, deixando-me incrédulo muitas vezes com o que lia. Se o leitor destas linhas pretende ler uma biografia desse enorme actor de Hollywood, um dos melhores representantes dessa arte denominada “o método”, recomendamos vivamente o livro “Canções que a Minha Mãe me Ensinou”, escrito a duas mãos por Marlon Brando e Robert Lindsey e depois temos sempre esses filmes inesquecíveis que Marlon Brando nos deixou e onde nos revela todo o seu talento, sugiro que comecem pelo genial “Julio César”/ “Julius Caesar” de Joseph L. Mankiewicz.

Rui Luís Lima

“Astérix e Cleópatra” - Albert Uderzo / René Goscinny

Rui Luís Lima, 16.11.25

astérix.jpg

“Astérix e Cleópatra” / "Asterix et Cleopatre"
Argumento: René Goscinny
Arte: Albert Uderzo
Páginas: 48
Asa

Albert Uderzo, esse célebre desenhador que nos ofereceu Astérix, Humpá-Pá e Tanguy e Laverduree o seu companheiro de aventuras o célebre René Goscinny, que também escreveu as aventuras do "Petit Nicolas" ( "Menino Nicolau", para além de criar inúmeros herpois da 9ª arte,  já nos deixaram, infelizmente, mas as suas criações são imortais e continuarão a viver ao nosso lado fazendo-nos sorrir com as aventuras destes irredutíveis Gauleses, como lhes chamava Júlio César, que tinha conquistado toda a Gália, menos a sua aldeia. Recordo aqui o meu álbum favorito do herói, que também foi a primeira história que li de Astérix e do seu inseparável amigo Obélix, nas páginas da revista Tintin, nesse longínquo ano de 1968.

astérix e cleopatra.jpg

“Astérix e Cleópatra” surgiu pela primeira vez na revista Pilote a 5 de Dezembro de 1963 e a sua publicação durou até 24 Setembro de 1964 ou seja dos números 215 a 257 da célebre revista francesa de banda desenhada, onde René Goscinny era um dos principais responsáveis, tendo surgido em álbum em 1965.

Rui Luís Lima

O cachimbo de Maigret

Rui Luís Lima, 15.11.25

e.jpg

O cachimbo é um elemento preponderante na literatura e o célebre cachimbo do Comissário Maigret até deu origem a um dos mais famosos contos de Georges Simenon que surgiu no nº.600 da célebre colecção de policiais “Vampiro” editada pela “Livros do Brasil”.

vampiro 600.jpg

«Maigret depositara os processos numa esquina da secretária, batera o fornilho do cachimbo ainda quente no rebordo da janela, voltara a sentar-se e a sua mão, maquinalmente procurara outro cachimbo onde ele deveria estar, à sua direira.

Não estava. Havia realmente três cachimbos, um dos quais de espuma, mas o bom, aquele que procurava, aquele a que mais vezes recorria, que a mulher lhe tinha oferecido há dez anos, aquando de um aniversário, aquele a que ele chamava o seu bom velho cachimbo, enfim, não estava ali.»

georges simenon.jpg

Na verdade fora um jovem que tinha estado no seu gabinete que levara o célebre cachimbo de Maigret, mas nesta visita ao cachimbo também não nos poderemos esquecer do sofisticado cachimbo de Sherlock Holmes e depois temos os escritores que surgiam sempre com os seus cacimbos nas fotografias: William Faulkner, Raymond Chandler, Arthur Conan Doyle, Georges Simenon entre outros. Mas também temos o cacimbo na pintura, sendo o mais célebre do pintor surrealista belga René Magritte.

Nos dias de hoje já é difícil entrar num café e sentir o delicioso cheiro do tabaco de cachimbo, porque é proibido fumar nos cafés a bem da saúde pública e o fumador de cachimbo, que muitas vezes prepara com um enorme carinho o tabaco terá de se refugiar em casa para o fumar tranquilamente.

amphora.jpg

Foi na "Concorrente" em Campo de Ourique que três membros do futuro "Café dos Filósofos" compraram os seus cachimbos e depois, com o dinheiro que sobrou, juntaram as moedas e adquiriram uma embalagem de "Borkum Riff", que custou 17$50, aconselhados pela simpática senhora da loja (ninguém queria o então conhecido tabaco nacional"Gama") e assim eles deam inicio às suas cachimbadas, nesse ano de 1973! 

Depois um familiar, com quem descobri o rock, recomendou-me o "Clan", desaconselhando-me o "Gama", mais tarde encontrei o maravilhoso "Mayflower", até chegar a esse universo chamado "Amphora". Iniciei-me com o "Amphora"(vermelho), mas no dia em que o Tapioca, que criava o seu próprio tabaco de cachimbo com "especiarias", me aconselhou o "Amphora" (Azul), descobri o Paraíso.

Mas, uns anos depois, o Amphora (Azul) começou a desaparecer de circulação e na famosa Casa Havaneza, depois de me confirmarem o seu desaparecimento, recomendaram uma loja de tabacos na Almirante Reis, que ainda tinha o famoso tabaco de cachimbo; quando lá cheguei, encontrei dois outros fumadores de cachimbo, que lamentavam com o amável vendedor o fim do maravilhoso "Amphora" (azul). Anos depois ele reapareceu, mas a fórmula tinha sido mudada e até o azul era um pouco diferente.

maigret.jpg

Quanto ao célebre cachimbo de Maigret que levara o Comissário a percorrer a pé o Boulevard Richard Lenoir olhando para todos os lados em busca do seu precioso companheiro, que tantas vezes o ajudou nas investigações, começou a perder a calma e a Madame Maigret é que teve de acalmar o marido, mas depois de vários acontecimentos o jovem devolveu o cachimbo ao Comissário, e este disse. «Deixa lá que eu te vou dar  outro cachimbo! E ainda maior se o quiseres.

- Só que – replicou o garoto – não será o seu!»

Rui Luís Lima

Philippe Sollers - "A Estrela dos Amantes"

Rui Luís Lima, 14.11.25

a estrela dos amantes.jpg

Philippe Sollers
"A Estrela dos Amantes"
Páginas: 150
Teorema

Na net é possível encontrar diversos inquéritos ou questionários, se preferirem, sobre a relação dos leitores com os livros e um dia encontrei uma questão que passo a reproduzir: "Considerando que o primeiro livro da tua estante é a letra “A”, o segundo a letra “B” e por aí adiante, tira o livro correspondente à primeira letra do teu nome, depois abre na página correspondente à soma do mês e dia em que nasceste. Qual é o quarto parágrafo?"

Ao ler esta pergunta sou obrigado a encará-la como uma espécie de equação "matemática" que, de imediato, ao contrário do que se julga, pratica a exclusão. E digo isto porque seguindo os dados indicados para a escolha do livro ou melhor os passos em volta da minha biblioteca, retirei o livro correspondente. E convém dizer que por razões de espaço ou a falta dele, os meus livros espalham-se pelos móveis sem ordem definida, mas por tamanho, de forma a utilizar o máximo de espaço possível.

Ao retirar o livro em questão descobri que se tratava de "Paradis", de um autor muito querido, Philippe Sollers, e a resposta à questão “literária” tornou-se impraticável, pois o genial "Paradis" não possui parágrafos, aliás não tem qualquer sinal de pontuação, é para se ler devagar, utilizando o leitor a sua respiração para fazer a respectiva pontuação ou seja sentir esse prazer do texto de que Roland Barthes falou/escreveu.

"Paradis" foi publicado inicialmente em formato de folhetim, ao longo de quatro anos na revista "L'Infini", da qual Philippe Sollers foi o principal "animador". Recorde-se que "L'infini" sucedeu à famosa revista "Tel quel", que agitou e de que maneira as águas francesas da literatura e não só, ao navegar por outros oceanos. Mas se desejar conhecer este romance de Philippe Sollers, leia primeiro "Sollers écrivain" de Roland Barthes, recentemente reeditado pela Points.

Voltando à equação desta pergunta, percebi que tinha obtido um resultado, o escritor chama-se Philippe Sollers e é um nome incontornável da literatura. Sendo assim, decidi ir buscar um dos poucos livros editados em Portugal de Philippe Sollers intitulado "A Estrela dos Amantes" (*) e confesso que apenas conheço três, já a minha pequena biblioteca conta com mais de 30 e a culpa do meu "encontro" com ele foi um quadro de Pablo Picasso que surge na edição de bolso (o famoso formato, tão desprezado em Portugal) de "Femmes". Aqui vos deixo um pouco da escrita desse genial escritor que é urgente (re)descobrir e editar no nosso país.

(*) - Este livro foi descoberto na estação de comboios do Rossio ao preço de 1 (um) euro e consegui tirar o autocolante com o preço da capa sem a danificar, o exemplar estava mais que novo!

Rui Luís Lima

sollers1.jpg

«Para atingir a compreensão, dizem os textos antigos, é preciso olhar a estrela do Norte virando-se para sul. Olha, é fácil e ocorre-nos por intuição. O mundo é um teatro, podemos vê-lo de todo o lado, numa sucessão. Não é por eu estar aqui que não estou lá em baixo. O passado muito antigo está pertíssimo. Eu sou ondulante, diverso, possuo mais recordações de que se tivesse seis mil anos. Assim habitei a pequena rua dos Alquimistas em Praga. O meu amigo K. e eu íamos aos bordéis da cidade, mas não fiquei por muito tempo, tinha de regressar a Paris.»

Philippe Sollers

in “A Instrução dos Amantes”

philippe sollers.jpg

Philippe Sollers - (1936 - 2023)

Philippe Sollers deixou-nos aos 86 anos, deixando-nos dezenas de livros, que abriram decididamente os horizontes a todos os seus leitores, que aprenderam com ele o significado da liberdade de pensar e escrever sem amarras a dogmas, sempre inconformista e recusando o colete de forças contemporâneo que nos pretendem impôr em nome dos novos valores.

Philippe Sollers revelou ser um nome incontornável no universo cultural.

Obrigado Philippe Sollers por todos os belos livros que nos deixaste.

Paula e Rui Lima

Nuno Júdice - “O Estado dos Campos”

Rui Luís Lima, 13.11.25

o estado dos campos.jpg

Nuno Júdice
“O Estado dos Campos”
Páginas: 154
Dom Quixote

Foi na década de setenta, do século xx, que descobri a poesia de Nuno Júdice, na colecção “Cadernos de Poesia” das Publicações D. Quixote, tratava-se precisamente do seu primeiro livro de poemas intitulado “A Noção de Poema” e desde então tornei-me um leitor fiel da sua obra poética como da restante obra em prosa e teatro, recordo-me do magnífico “Última Palavra: «Sim»” saído nas edições & etc, ou o fabuloso “Plancton” na editora Contexto.

Nuno Júdice nasceu para o universo público nas páginas do Diário de Lisboa em 1967, onde outros nomes da mesma geração, hoje consagrados, ofereceram os seus primeiros trabalhos poéticos. Mantendo intensa actividade crítica com inúmeros ensaios publicados em jornais e revistas, o poeta manteve uma regularidade e uma qualidade poética que merecem ser referidos, onde a Literatura é uma constante presença através da sua História, mas também através das inúmeras referências românticas, que servem tantas vezes de ponto de partida para poemas que se guardam na memória com enorme carinho. Aqui vos deixo o meu poema favorito da obra “O Estado dos Campos”, saído em 2003.

Rui Luís Lima

nuno júdice.jpg

Retrato de Mulher à Luz da Tarde

O poeta épico e o poeta dramático, disse

Goethe, estão submetidos às mesmas leis gerais. No

entanto, se cada um deles conduz o poema

até ao seu desfecho sem uma hesitação,

ou antes, limitando a dúvida ao que se passa

no espírito quando o amor, com a sua certeira

seta, o fere, já as palavras são diversas. Não é o mesmo

descrever a emoção com as imagens que ela sugere,

ou transformá-la num discurso lógico, que obriga

quem o faz a utilizar o raciocínio, deixando

para depois o sentimento. A construção é o mais

simples, neste processo, desde que o princípio

corresponda à verdade que faz parte da vida

de quem ama. O difícil é transpor a ponte

que nos conduz ao outro: refiro-me a ti, que

me esperas desse lado, por trás das árvores

e das flores do jardim, com o sol a iluminar-te

o rosto. É uma imagem simples: retrato

de mulher à luz da tarde. Mas sinto-me obrigado

a dar uma outra dimensão à figura humana,

puxando-a para o convívio da minha alma. Aí

as coisas ganham a profundidade de uma relação

abstracta, despida dos aspectos materiais, e

dos obstáculos que a realidade nos coloca. A

perfeição nasce das frases que o verso trabalha, com

o ritmo de uma respiração serena. Por fim, a

imagem adquire uma beleza própria, que foge

à própria fonte. E ao vê-la, pergunto: ainda és tu? Ou

foste roubada a ti própria por esta luz com que o poema

te envolve? Mas deixo-me de questões teóricas - e

atravesso a ponte, deixando para trás imagens e

discursos. É que do outro lado as leis gerais não

contam, e são-me indiferentes os problemas que se

colocam ao poeta, épico ou dramático. Puxo-te

pela mão - e saímos da moldura, para dentro da vida.

Nuno Júdice

in "O Estado dos Campos"

Bruno Brazil - "Sarabanda em Sacramento"

Rui Luís Lima, 12.11.25

bruno brazil.jpg

Bruno Brazil
"Sarabanda em Sacramento" / "Sarabande a Sacramento"
Arte: William Vance
Argumento: Louis Albert
Páginas: 46
Bertrand

bruno brazil1.jpg

Quando iniciei as minhas leituras das aventuras de Bruno Brazil em 1967, na revista Tintin (portuguesa) a banda desenhada era assinada por William Vance (desenho) e Louis Albert (texto). Mas nos dias de hoje encontramos os mesmos álbuns assinados por William Vance e Greg. Confusos?

A história é simples e conta-se da seguinte forma: Michel Regnier foi um fabuloso autor de banda desenhada que um dia até confirmou que também tinha dotes de desenhador ao criar a personagem Achille Talon, assinando os seus trabalhos com o pseudónimo de "Greg". Ao ser criada a série Bruno Brazil através do desenhador William Vance, Michel Regnier decidiu assinar a obra com o pseudónimo de Louis Albert, em virtude de ter outros trabalhos na revista Tintin assinados como Greg.

william vance - greg.jpg

William Vanve e Louis Albert (Michel Regnier)

Neste novo Milénio as reedições dos álbuns de Bruno Brazil passaram a surgir assinados pela dupla William Vance / Greg e as capas também foram alteradas em relação às que surgiram nas primeiras edições dos álbuns.

Pela parte que me toca mantenho-me fiel à minha memória: William Vance / Louis Albert, são os nomes dos autores da banda desenhada Bruno Brazil.

(*) - Greg era o pseudónimo mais utilizado pelo genial argumentista Michel Regnier.

Rui Luís Lima

“José Fonseca e Costa – Um Africano Sedutor” - Jorge Leitão Ramos

Rui Luís Lima, 11.11.25

josé fonseca e costa.jpg

“José Fonseca e Costa – Um Africano Sedutor”

Jorge Leitão Ramos
Páginas: 276
Guerra e Paz/SPAutores

kilas o mau da fita.jpg

Foi na minha adolescência que comecei a ler as críticas de cinema de Jorge Leitão Ramos, no Diário de Lisboa e mais tarde no Semanário Expresso, um crítico que tem dedicado ao longo da sua vida uma enorme atenção à História do Cinema Português, basta aliás recordar os seus famosos Dicionários de Cinema Português, editados pela Editorial Caminho, que se têm revelado obras incontornáveis no estudo do Cinema Português.

sem sombra de pecado.jpg

José Fonseca e Costa é um dos mais fascinantes cineastas do denominado Cinema Novo, que nunca se quis filiar nas diversas correntes que se foram criando ao longo dos anos, optando por ser um verdadeiro "outsider", construindo uma obra cinematográfica que, ao longo dos anos, conseguiu marcar esteticamente o gosto do cineasta, ao mesmo tempo que conquistava o espectador de cinema, obtendo quase sempre excelentes resultados de bilheteira, apesar de um ou outro filme não terem atingido o objectivo pretendido, como viria a suceder com “Os Cornos de Cronos”, a que se deve a figura desadequada do protagonista, que aliás manteve uma relação bastante complexa com o cineasta, ao longo da rodagem da película. Mas se falarmos em “Kilas, o Mau da Fita” e Mário Viegas, “Sem Sombra de Pecado” e Victoria Abril, “Balada da Praia dos Cães” e Raul Solnado num papel dramático, ou “Cinco Dias, Cinco Noites” com um Vitor Norte fabuloso, qualquer espectador de cinema conhece e gostou de um destes filmes que terminei de mencionar, que são bem representativos do saber deste cineasta nascido em Moçambique e chamado José Fonseca e Costa.

jorge leitão Ramos.jpg

Foi José Jorge Letria que lançou o convite através da SPAutores a Jorge Leitão Ramos para escrever uma biografia sobre José Fonseca e Costa e, aceite o repto, o crítico falou com o cineasta expondo as directrizes do que viria a ser este livro incontornável, sobre um dos nomes mais importantes do Cinema Novo e assim foram encontrando-se crítico e cineasta, conversando e recordando uma amizade estabelecida à longa data. Mas se o leitor pensa estar perante uma simples biografia de um cineasta ou um desses livros que abordam a filmografia de um realizador está profundamente enganado, porque Jorge Leitão Ramos oferece-nos um verdadeiro romance sobre a vida e obra de José Fonseca e Costa.

cinco dias cinco noites.jpg

Em “José Fonseca e Costa – Um Africano Sedutor”, acompanhamos a par e passo a vida do cineasta, desde a forma como veio estudar para o Continente e a ida para a província com a irmã, ficando ambos chocados com o frio da serra em oposição ao calor africano, vendo-se a família obrigada a optar por os levar para Lisboa, onde o clima era mais ameno, mas também toda a sua actividade política no denominado Movimento Anticolonialista e a forma como enganava as autoridades de então, para anos mais tarde descobrir que numa passagem por Angola para encontrar velhos amigos, não iria poder sair do avião oriundo de Moçambique. Mas também temos o cinema e as célebres lutas de então, nos famosos planos de produção em busca de uma oportunidade e a afirmação de um homem que sabia o que queria e lutava para o conseguir, terminando por realizar alguns dos filmes mais marcantes do Cinema Português do século XX. Infelizmente, José Fonseca e Costa deixou-nos pouco tempo antes deste livro de Jorge Leitão Ramos estar terminado, mas a leitura de “José Fonseca e Costa – Um Africano Sedutor” faz com que ele e o seu cinema permaneçam bem vivos no interior da Sétima Arte deste país.

Rui Luís Lima

Yukio Mishima - "O Marinheiro Que Perdeu as Graças do Mar"

Rui Luís Lima, 10.11.25

yukio mishima livros.jpg

Yukio Mishima
"O Marinheiro Que Perdeu as Graças do Mar" / "Gogo no-eiko"
Assírio & Alvim 

o marinheiro que perdeu as graças do mar.jpg

Yukio Mishima
"O Marinheiro Que Perdeu as Graças do Mar" / "Gogo no-eiko"
Livros do Brasil

Um dia, numa conversa num café à volta de livros e autores, alguém me perguntou se tinha algum personagem literário que gostaria que tivesse ficado esquecido pelo seu criador? E de imediato me veio à memória esse genial escritor japonês chamado Yukio Mishima, de cuja obra literária sou admirador. Recorde-se que Yukio Mishima é um dos mais importantes escritores japoneses do século XX e o mais célebre no mundo ocidental, tendo até Margueritte Yourcenar escrito um belo ensaio intitulado "Mishima ou a Visão do Vazio" sobra a sua vida e obra.

Ao longo da sua extensa obra literária, Yukio Mishima aliou o erotismo com a crueldade, criando um universo extremamente sedutor, mas a sua vida era o espelho da sua obra e a sua obra o reflexo da sua vida.

O nacionalismo e a honra que defendia eram a memória dos velhos samurais, essa mesma memória de que Akira Kurosawa nos falou um dia, perdida para sempre num Japão industrializado e em muitos aspectos ocidentalizado, fruto da ocupação americana, após o final da 2ª Grande Guerra Mundial.

yukio mishima.jpg

Foi o amor de Yukio Mishima pela escrita do sangue que o irá conduzir através dessa estrada sem retorno e sem paragem na famosa encruzilhada, que nos convida sempre a meditar sobre a decisão por ele tomada. A 25 de Novembro de 1970 decide, com quatro alunos das suas Forças, tentar um Golpe de Estado que sabia votado ao fracasso, para repor a Ordem Imperial. Na véspera enviara para o editor "O Mar da Fertilidade", a sua última obra, composta por quatro volumes, verdadeiro Testamento Literário e uma obra incontornável de um dos maiores escritores do século xx. Vivendo numa sociedade virada para o futuro e para o consumo e querendo impor o amor pelo passado e pela tradição, Yukio Mishima faz o "hara-kiri" perante uma multidão de soldados e jornalistas que, incrédulos, assistem à partida do Último dos Samurais.

Em “O Marinheiro Que Perdeu as Graças do Mar”, primeiro livro de Yukio Mishima a ser publicado em Portugal, é-nos oferecida uma personagem que até gostaríamos que não tivesse sido criada pelo genial escritor japonês. Trata-se de Noburo, uma criança cruel, que no final do livro irá dar-nos a conhecer o verdadeiro sentido da palavra, mas que Yukio Mishima nos oferece com essa rara delicadeza que sempre caracterizou a sua escrita.

Descobrir este fabuloso livro de Yukio Mishima é a nossa sugestão de hoje e, se desejarem, podem sempre procurar no livro de António Mega Ferreira, que reúne diversas crónicas do autor, intitulado “A Borboleta de Nabukov” o magnifico texto que ele escreveu para o Jornal de Letras, aquando da primeira edição de “O Marinheiro Que Perdeu as Graças do Mar” e também nunca é demais recomendar a leitura do livro de Margueritte Yourcenar sobre Yukio Mishima, sobre o qual já escrevemos aqui.

Rui Luís Lima

Valerian - "Sonhos Maus" - Jean-Claude Mézières / Pierre Christin

Rui Luís Lima, 09.11.25

valerian.jpg

Valerian
"Sonhos Maus" / "Les Mauvais Rêves"
Arte: Jean-Claude Mézières
Argumento: Pierre Christin
Asa / Público

Assim começavam as aventuras, através do portal do tempo, dessa personagem chamada Valerian, criada pela genialidade de dois homens, Pierre Christin e Jean-Claude Mézières, amigos desde a infância, e que irão ficar surpreendidos pela excelente recepção dada, pela redacção da Revista Pilote e posteriormente dos seus leitores, a este viajante espacial e à sua bela companheira terrestre chamada Laureline, que ele irá encontrar numa das suas viagens, em pleno século X, na aventura “Sonhos Maus” / "Les Mauvais Réves",, tornando-se assim a sua bela e inseparável companheira.

Foi precisamente com "A Cidade das Águas Adormecidas" que me encontrei pela primeira vez com Valerian nas páginas da Revista Tintin (portuguesa) e confesso que desde logo me tornei fan da dupla Valerian / Laureline.

Este aventureiro do espaço, que viaja através do tempo foi criado pela dupla Pierre Christin (argumento) e Jean-Claude Mézières, tendo surgido pela primeira vez em França, na Revista Pilote a 9 de Novembro de 1967, tornando-se rapidamente num “icon” da banda desenhada franco-belga.

Rui Luís Lima